Ecologia e genômica foram os temas abordados pelos participantes
Após dias incríveis em Curitiba e região metropolitana, além de Guarapuava, os participantes da Missão de Pesquisadores Estrangeiros no Paraná continuaram o evento na cidade de Foz do Iguaçu. Na manhã do dia 12 de abril, os pesquisadores foram até o Parque Nacional do Iguaçu, para participarem da sessão “Ecologia e genômica aplicada à conservação e saúde dos ambientes terrestres”.
A primeira apresentação do dia, denominada “Parque Nacional do Iguaçu: uma breve visão geral”, ficou por conta do representante do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e analista ambiental, Marius da Silva Pinto Belluci. O IMCBio é o órgão estadual que organiza e administra o Parque Nacional do Iguaçu. Além disso, também é responsável pela administração de mais de 330 Unidades de Conservação (UC) Federais no Brasil, bem como possui 14 Centros Nacionais de Pesquisa e Conservação, com foco em espécies ameaçadas de extinção.
Cataratas no Parque Nacional do Iguaçu
Essa abertura foi importante para que todos os participantes da Missão ficassem mais conectados ao ambiente em que estavam e aprendessem mais sobre um dos lugares mais importantes no Brasil, no que diz respeito à conservação da nossa biodiversidade.
“O Parque Nacional do Iguaçu é uma UC de Proteção Integral, dotada de atributos naturais excepcionais. Portanto, constitui-se objeto de preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilita a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico e é permitida a visitação pública, condicionada às restrições específicas”, informou o IMCBio.
Para quem não sabe quem foi Chico Mendes, informamos que essa pessoa tem tudo a ver com o órgão estadual! “Ele era um seringueiro brasileiro. Líder sindical e ambientalista, que lutou pela preservação da floresta amazônica e defendeu os direitos humanos dos camponeses e povos indígenas brasileiros. Ele foi assassinado por um fazendeiro em 22 de dezembro de 1988”, comentou o representante do ICMBio.
E Chico Mendes estava super correto, já naquela época, em sua preocupação com a preservação ambiental brasileira. Veja no mapa abaixo a diferença da imensidão da Mata Atlântica, desde a chegada dos portugueses ao Brasil até o ano de 2007.
Marius da Silva Pinto Belluci apresentando gráfico que mostra os remanescentes da Mata Atlântica até 2007
Atualmente, a área mais concentrada e preservada de Mata Atlântica, na região sul do Brasil, fica situada, justamente, no Parque Nacional do Iguaçu. Isso só evidencia a sua importância para a manutenção da nossa biodiversidade.
O Parque foi criado, por meio do Decreto Federal Nº. 1.035, em janeiro de 1939. É o segundo mais antigo do Brasil e conta, desde 1981, com uma área de 185.262 hectares. Cinco anos depois, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o declarou Patrimônio Mundial Natural.
De acordo com o IMCBio, o Parque “protege uma riquíssima biodiversidade, constituída por espécies representativas da fauna e flora brasileiras, das quais algumas ameaçadas de extinção, como onça-pintada (Pantheraonca), puma (Puma concolor), jacaré-de-papo-amarelo (Caimanlatirostris), papagaio-de-peito-roxo (Amazona vinacea), gavião-real (Harpia harpyja), peroba-rosa (Aspidospermapolyneutron), ariticum (Rolliniasalicifolia), araucária (Araucariaaugustifolia), além de muitas outras espécies de relevante valor e de interesse científico”.
Apresentação de Marius da Silva Pinto Belluci
“Além disso, temos uma grande rede de água protegida aqui no parque. Nós temos a Bacia do Rio Floriano, uma área geográfica que fica toda dentro do Parque. É a bacia hidrográfica mais protegida do Brasil. A qualidade da água está aqui. A melhor qualidade de água do Brasil está aqui”, afirmou Belluci.
Não só os australianos, mas os brasileiros também ficaram encantados em conhecer ainda mais sobre um dos Parques mais importantes do mundo. E seguindo a linha de conservação, o professor da Macquarie University, doutor Adam Stow, realizou a apresentação “Conservação e genômica evolutiva”.
O professor explicou que seu trabalho, juntamente com sua equipe, é de analisar e descobrir os processos que influenciam a conservação das espécies, levando em consideração o ambiente em que elas vivem e sua adaptação a esses espaços.
Doutor Adam Stow realizando sua apresentação
“Uma das maneiras de fazer isso é identificar diferentes partes do ambiente que acreditamos que possam influenciar o movimento e o fluxo genético desses animais na paisagem. Saímos a campo e medimos os fatores ambientais que acreditamos que possam ter influência e visitamos todos esses locais de monitoramento, medimos a abundância, e também medimos variáveis ambientais, como tipos de solos, vegetações, predadores, enfim…”, detalhou Stow.
Dessa forma, o ambiente é capaz de incitar variações genéticas nas espécies, sejam elas animais ou vegetais. Isso ocorre para que as espécies mantenham sua sobrevivência e se adaptem às alterações ambientais.
No Brasil, um excelente programa focado em restauração é o de Pesquisa Ecológica de Longa Duração (PELD), que foi também o título da apresentação do professor da Universidade Estadual de Londrina (UEL), doutor José Marcelo Domingues Torezan. Na apresentação em Foz, ele trouxe, em específico, o trabalho realizado pelo PELD da Mata Atlântica do Norte do Paraná (PELD MANP), projeto que ele coordena.
Doutor José Marcelo Domingues Torezan realizando sua apresentação
“No Estado do Paraná existem dois locais para trabalhos intercontinentais de longa duração. O MANP e o PIAP (Planície de Inundação do Alto Rio Paraná), da bacia hidrográfica do Rio Paraná. Nosso sítio é uma região onde a Mata Atlântica foi praticamente destruída. Então, temos apenas fragmentos para estudar. Nossa questão é como a fragmentação afeta as plantas e os animais e como é possível restaurar a natureza nesse contexto. Portanto, é a nossa verdadeira questão de pesquisa profunda”, explicou o coordenador do PELD MANP.
O projeto monitora, atualmente, abelhas, vespas, besouros, aranhas, estoques, pássaros, borboletas, mamíferos, espécies de madeira e de árvores. Ou seja, o ecossistema como um todo, para analisar de que forma essas espécies estão se comportando nesses sítios protegidos.
“Monitoramos fragmentos florestais e locais de restauração. Esses locais de restauração são todos de reflorestamento, plantações de mudas de espécies arbóreas nativas. Temos quatro locais onde os fragmentos florestais ficam lado a lado com os locais de restauração, compartilhando a mesma inclinação, altitude, restos, tipo de solo e assim por diante”, detalhou Torezan.
E pensando nesses fragmentos florestais, o professor da UEL, doutor Luiz dos Anjos, realizou a sua palestra “Monitoramento de aves e mamíferos nas florestas do Paraná”, abordando o foco de seu estudo que é na Mata Atlântica.
Doutor Luiz dos Anjos realizando sua apresentação
Como foi visto com o representante do IMCBio, a floresta era um espaço contínuo de vegetação e, atualmente, é composta por pequenos fragmentos de floresta distantes, onde os pesquisadores estudam aves e mamíferos, bem como seus comportamentos.
O professor comentou que monitora 25 fragmentos, desde Londrina até próximo à Foz do Iguaçu, analisando quais espécies estão presentes nesses espaços e sua quantidade. Inclusive, um dos espaços monitorados é, justamente, a Trilha do Poço Preto, localizada dentro do Parque Nacional do Iguaçu e que foi visitada pelos participantes da Missão antes das apresentações. No decorrer da trilha, há cinco conjuntos de pontos de análise, em cada quilômetro.
Participantes da Missão observando pássaros na Trilha do Poço Preto
Luiz dos Anjos ainda comenta que alguns fragmentos já possuem dez anos de amostras, ou seja, uma grande quantidade de material para ser estudado. “Uma das coisas que fizemos foi analisar o número de espécies dominantes, intermediárias e raras. No total, registramos 138 espécies de aves nesses 10 anos de estudos. E reconhecemos cinco espécies dominantes, 26 intermediárias e uma em cada sete raras”, contou.
Ainda pensando em Mata Atlântica, o coordenador geral do NAPI Biodiversidade: RESTORE e professor da UEL, doutor Halley Caixeta de Oliveira, realizou a apresentação “Estratégias de uso de nitrogênio em árvores da Mata Atlântica”. A ideia foi detalhar uma pesquisa em andamento, que busca auxiliar o desenvolvimento de espécies arbóreas na floresta, utilizando compostos com nitrogênio como base.
De acordo com o professor, estudos foram feitos com duas espécies: os pinheiros e os eucaliptos. Os primeiros são altamente sensíveis à amônia (NH3) – composto químico constituído por um átomo de nitrogênio e por três átomos de hidrogênio -, ou seja, não se desenvolvem bem com esse produto.
No entanto, os pinheiros se dão muito bem com o nitrato em sua composição. O nitrato é um composto químico formado pelo íon nitrato (NO3-) e tem a função de ser a principal fonte de nitrogênio para os vegetais. Dessa forma, por essa espécie de árvore ter uma afinidade com o nitrato, os pesquisadores aplicam o composto nas plantas e essas acabam se desenvolvendo melhor. Os pinheiros crescem mais fortes, mais rapidamente e mais saudáveis com o auxílio dessa técnica.
Doutor Halley Caixeta de Oliveira realizando sua apresentação
Já os eucaliptos, diferentemente do pinheiros, funcionam muito bem com a amônia, crescendo muito mais quando o composto é aplicado neles.
O professor aponta que um estudo muito importante auxiliado a esses testes diz respeito à avaliação de atividades agrícolas. Isso porque, é necessário verificar se essas atividades afetam diretamente ou não, a assimilação de nitrogênio das árvores, uma vez que pode existir o uso de pesticidas ou agrotóxicos.
“A gente compara duas áreas para esse estudo: uma é chamada de ‘fronteira’, localizada perto do nosso local de restauração, e a outra é o ‘recultivo’, que fica na divisa das lavouras. Analisando as respostas das duas áreas é possível fazer o comparativo entre as árvores”, explica o coordenador geral do NAPI Biodiversidade: RESTORE.
Já o professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), doutor Rodrigo Lingnau, realizou a sua apresentação “Anfíbios do Estado do Paraná: história natural e conservação “. Você pode acompanhar parte do trabalho do professor nesse vídeo, indicado por ele:
E, já que o evento foi realizado nas dependências do Parque Nacional do Iguaçu, nada mais justo do que abordar um projeto realizado por lá! “Monitoramento de assembleias de árvores no Parque Nacional do Iguaçu” foi apresentado pelo professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), doutor Victor Zwiener. De acordo com ele, um monitoramento das árvores do Parque está sendo feito, desde 2011. Foram realizadas coletas de dados também em 2013, em 2015 e, por último, em 2022.
“Estamos planejando fazer outro levantamento, talvez daqui a cinco anos, porque vimos que dois anos não é tempo suficiente para realmente observar quaisquer diferenças nas estruturas das árvores”, explicou o professor.
Segundo Zwiener, foi realizado todo o mapeamento das árvores individuais do Parque. “Temos exatamente a posição de cada árvore. É mais fácil localizá-las mais tarde, quando você vai, depois de alguns anos, procurá-las. Não é simples encontrar a mesma árvore novamente, então, o mapeamento ajuda muito nisso”, afirmou.
Doutor Victor Zwiener realizando sua apresentação
Além disso, um dos resultados gerados com o monitoramento foi o de mortalidade e os incrementos de novos indivíduos no Parque. “Estamos vendo que, nos primeiros anos, houve praticamente um equilíbrio entre espécies que estão perdendo e espécies que estão ganhando espaço por aqui. Então, há alguns locais que se tornam mais ricos em algumas espécies, alguns locais que estão perdendo algumas espécies, e isso está gerando uma rotatividade de tipos de árvores”, explicou o professor.
Dessa forma, é possível ter um controle de como tipos árvores têm se comportado dentro do Parque Nacional do Iguaçu, analisando como o espaço tem se tornado, ou não, atrativo para elas e o que faz com que algumas espécies mantenham sua permanência e outras acabam sumindo.
Agora, indo para a Austrália, o professor da Western Sydney University e pesquisador do The Hawkesbury Institute for the Environment (HIE), doutor Ian Wright, fez a apresentação “Monitoramento de longa duração no HIE: breve visão geral”. O objetivo foi detalhar os estudos de bioacústica realizados por colegas pesquisadores do Instituto.
A bioacústica é a ciência que une a biologia à acústica. No geral, é feita uma investigação da produção sonora, sua dispersão em um meio e sua recepção pelos animais, incluindo os humanos, é claro.
Doutor Ian Wright realizando sua apresentação
O grupo realiza um monitoramento acústico com Raposas Voadoras Australianas que, apesar do seu nome, são, na verdade, uma espécie de morcego. “Os pesquisadores usam uma série de técnicas diferentes para monitorar as populações de morcegos. O problema é que, com o aumento da frequência das ondas de calor na Austrália e da intensidade destas ondas de calor, estes pobres morcegos estão literalmente caindo das árvores. Então, quando temos uma onda passando por milhares desses morcegos, eles simplesmente caem e morrem, já que tem pouca tolerância térmica”, explicou o professor.
Por isso, os pesquisadores estão fazendo uma combinação de ondas sonoras, drones, radares e satélites meteorológicos para rastrear as populações e poder realizar estudos visando a preservação da vida dessa espécie.
Após uma grande partilha de conhecimento foi hora de conhecer as belezas do Parque Nacional do Iguaçu e seus arredores, como o Parque das Aves, que é a única instituição do mundo focada na conservação das aves da Mata Atlântica. Inclusive, o Parque é localizado dentro de um remanescente dessa rica floresta. São 16 hectares de Mata Atlântica restaurada, o que equivale a 160 mil m²!
Arara Azul no Parque das Aves
No sentido de ações para recuperação de espécies, o Parque é responsável por avaliar ameaças às espécies e conduzir planejamento na conservação das espécies que precisam de uma atenção reforçada. E isso tem dado muito certo, já que mais de 50% das aves do parque são resgatadas de tráfico de animais ou maus tratos.
Após a visita a inúmeras espécies de aves, os participantes da Missão retornaram ao Parque Nacional do Iguaçu para visitar um dos pontos turísticos mais importantes do planeta e que, em 2012, foi eleito uma das Sete Maravilhas Naturais do Mundo: as Cataratas do Iguaçu.
“As Cataratas do Iguaçu estendem-se numa frente semicircular de 2.700 metros de extensão, dos quais 800 metros estão do lado brasileiro e 1.900 metros do lado argentino. São compostas por um número variado de saltos e quedas que oscilam entre 150 e 270, de acordo com o volume de água do rio. Os saltos têm nomes próprios como Floriano, Deodoro, Benjamim Constant, mas, o mais famoso é a Garganta do Diabo”, informou a administração do Parque.
Que dia incrível, não é mesmo?! E esse foi apenas o primeiro da Missão de Pesquisadores Estrangeiros no Paraná, em Foz do Iguaçu! Continue conectado nas novidades do NAPI Biodiversidade para acompanhar como foram os últimos dias de evento.