Financiamento científico é tema na Missão de Pesquisadores Estrangeiros

Os debates ocorreram em Guarapuava, no Paraná

Se você conhece algum pesquisador brasileiro, sabe que uma das maiores dificuldades vividas por esses profissionais é conseguir captar bons financiamentos. Querendo ou não, para o avanço científico, além de bons cientistas, também é fundamental que haja dinheiro investido. Os recursos são utilizados para a contratação de pesquisadores, compra de equipamentos para experimentos, realização de viagens de coleta de material ou mesmo para a aquisição de materiais como reagentes, por exemplo. 

 

É por isso que, no terceiro dia da Missão de Pesquisadores Estrangeiros no Paraná, foi debatido o tópico de inovação e financiamento na ciência. A manhã do dia 10 de abril contemplou a sessão conjunta “Inovação, transferência de tecnologia e mecanismos de financiamento”. A atividade ocorreu nas dependências da Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO), em Guarapuava. 

 

A sessão foi coordenada pela diretora de Cooperação Institucional do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a doutora Maria Zaira Turchi, que entendeu o evento como uma ótima oportunidade para identificar potenciais oportunidades de financiamento nacional e internacional em projetos colaborativos.

 

“Além da necessidade de mecanismos adequados de financiamento, também é muito importante melhorar a legislação e as bases legais para possibilitar a implementação de ações colaborativas internacionais. Outro ponto importante é como avançar considerando a propriedade intelectual e outras questões que representam desafios e barreiras a serem superadas, no âmbito de uma colaboração internacional eficaz”, ressalta Turchi.

Doutora Maria Zaira Turchi compondo a mesa da sessão “Inovação, transferência de tecnologia e mecanismos de financiamento”.

Além disso, de acordo com a diretora, a Missão abriu portas para apresentar o Sistema de Ciência, Tecnologia e Inovação no Estado do Paraná para outros países, bem como ressaltar o apoio da Fundação Araucária a esse potencial em educação superior, ciência, tecnologia e inovação que o Estado possui.

 

“Estou começando, agora, a coordenação de um Programa voltado para a Internacionalização de Ciência, Tecnologia e Inovação no estado do Paraná. O principal objetivo é propor e implementar um programa estruturado para expandir e aprofundar redes internacionais, em conexão com a diáspora científica brasileira: brasileiros que estão em universidades e instituições científicas no exterior, incluindo suas equipes de pesquisadores, e que desejam cooperar com as universidades e instituições sediadas no Paraná”, afirma a doutora. 

 

Para a implementação do Programa, Maria afirma que alguns projetos pilotos estratégicos já foram identificados. Um deles é o Projeto de Genômica Vegetal, do ex-presidente do CNPq, doutor Evaldo Ferreira Vilela, que foi apresentado no evento, logo após a abertura de Turchi. 

Apresentação do projeto do doutor Evaldo Ferreira Vilela

A proposta de Vilela é formar uma rede de pesquisa estratégica para o desenvolvimento agrícola no Paraná, com base em seu projeto inicial “Rede de Pesquisa e Desenvolvimento em Genômica Vegetal do Estado do Paraná”. Para isso, será fundamental incluir como parceiros e, claro, financiadores, as universidades estaduais e federais, os institutos de pesquisa, empresas privadas e cooperativas agrícolas paranaenses, bem como empresas internacionais.

 

Para o ex-presidente, os impactos positivos com o desenvolvimento e a gestão desse projetos são diversos:

  • Criação de redes de pesquisa em genômica, integradas por parceiros com gestão estruturada, vinculado a programas de melhoramento de plantas de interesse para a economia do Paraná;
  • Formação de recursos humanos qualificados, em diferentes níveis de competência, uma vez que existe uma escassez de profissionais em melhoramento genético de plantas nos países ocidentais, como no Brasil;
  • Ampliação da oferta de material genético inovador em apoio a políticas públicas relacionados com a segurança alimentar.
  • Fornecimento e uso de informações sobre genes da biodiversidade tropical para uso em melhoramento de plantas;
  • Maior inserção do Paraná no cenário nacional e internacional como provedor de tecnologias-chave em atividades de melhoramento genético;
  • Ampliação de parcerias interessadas em melhoramento genético e produção de sementes;
  • Criação de startups focadas no desenvolvimento de tecnologias disruptivas e fortalecimento de um ecossistema de negócios internacionalmente competitivo em Genética, Genômica e Melhoramento de Plantas, bem como em Biologia Vegetal Aplicada;
  • Criação de um espaço para desenvolver estudos, opiniões e recomendações sobre desafios e demandas relacionadas ao desenvolvimento da agricultura paranaense.

Apresentação do projeto do doutor Evaldo Ferreira Vilela

Após a apresentação de Vivela, foi a vez do professor e pesquisador da Macquarie University, Grant Hose, trazer algumas orientações de como adquirir um financiamento de pesquisa ou, como ele mesmo afirmou, “como conseguir dinheiro para gerar conhecimento”. O professor ressaltou que, na Austrália, uma importante via de financiamento é o Conselho Australiano de Pesquisa, que possui dois principais programas: “Blue Sky” e “Linkage”. O primeiro gera subsídios para pesquisas em qualquer ramo e área, permitindo o estudo de infinitas temáticas. Já o segundo é focado na área das indústrias, sendo também apoiado por elas. 

 

De acordo com o pesquisador, ambos permitem que brasileiros também participem, recebendo bolsas e subsídios, desde que as pesquisas sejam lideradas por australianos. Ainda assim, é uma ótima oportunidade de colaboração entre cientistas dos dois países, não é mesmo?

 

Hose ainda afirmou que uma das principais cidades da Austrália, Sydney, tem se mostrado um importante ecossistema de inovação, juntamente com todo o Estado de New South Wales, onde ela se localiza. As duas governanças juntas, têm propiciado cada vez mais investimentos e financiamentos para pesquisa. Sydney concentra quase metade da população do país, possuindo diversos excelentes cientistas e milhares de importantes empresas.

 

Além disso, a cidade contém uma força muito importante para encorajar pesquisadores a criarem bases por lá, que é a ampla variedade de incubadoras e aceleradoras que oferecem mentoria, financiamento e serviços de apoio para startups. Inclusive, metade das startups australianas estão localizadas em Sydney.

 

Hose ainda reforça que, pensando nacionalmente, a Austrália também tem um governo que está cada vez mais preocupado com inovação científica. “Tanto os estados, quanto o Governo Federal, desempenham um papel fundamental na promoção da inovação, por meio de políticas, programas de financiamento e iniciativas para apoiar startups, bem como empresas estabelecidas no desenvolvimento de tecnologias e serviços de ponta”, afirma o professor. 

Apresentação do professor Grant Hose

Especificamente, o professor falou sobre a Macquarie University, onde atua, como importante incubadora. De acordo com ele, a universidade segue um modelo de “hélice tripla” para desenvolver ecossistemas de inovação, juntando pesquisadores/estudantes + empresários/indústrias + Governo. 

 

Esse envolvimento é muito ativo, gerando relatórios frequentes sobre o que tem sido desenvolvido, o que colabora para o desenvolvimento de novas políticas e na compreensão de necessidades dos empreendedores e dos inovadores. 

 

“A Incubadora da Universidade Macquarie foi inaugurada em 2017, apoiando mais de 133 empresas iniciantes e em expansão com programação educacional, redes de mentores e investidores, e conectando nossa comunidade diversificada, por meio de uma agenda lotada de eventos”, afirma o pesquisador. 

 

Os números gerados pela Incubadora, desde 2020, são super expressivos e importantes quando pensamos em financiamentos:

  • Mais de US$ 68 milhões investidos em financiamento;
  • Mais de US$ 30 milhões gerados em receita;
  • Mais de US$ 13 milhões pagos em salários;
  • Mais de 25 startups envolvidas em pesquisas;
  • Quase 2 mil alunos concluíram programas educacionais oferecidos;
  • Criação de mais de 150 novos empregos.

Outra importante instituição que  apoia o financiamento científico em solo australiano é a University of New South Wales (UNSW). Ela está vinculada ao Instituto de RNA, que tem como chefe de operações o doutor Joshua Peterson. O pesquisador realizou a apresentação “Inovação, transferência de tecnologia e financiamento”, trazendo à tona todos os avanços promovidos pelo Instituto e de que forma ele tem colaborado positivamente para a ciência. 

 

De acordo com Peterson, o Instituto de RNA é responsável pelo desenvolvimento e produção de processos pré-clínicos, bem como de RNA sintético, DNA plasmídico – capazes de se reproduzir independentemente do DNA cromossômico – e mRNA – o RNA Mensageiro, comumente usado para a formulação de vacinas. Além disso, o Instituto também realiza controle de qualidade e trabalha em pesquisas direcionadas à área da saúde, como câncer, doenças infecciosas (Covid, HIV, Dengue…), doenças raras e genéticas, bem como doenças de animais (bovinos, ovinos).

Apresentação do professor Joshua Peterson

Importante destacar que o Instituto trabalha em parcerias com outras instituições. Peterson ressalta como isso é importante e colabora para o avanço científico. Ele mostrou como a UNSW possui um ecossistema de pesquisa, com diversos centros e institutos que pesquisam juntos: genômica, bioinformática, medicina personalizada e clínica terapêutica.

 

Essas colaborações permitem que ocorra transferência de tecnologia, compartilhamento de conhecimento e uma facilitação para o desenvolvimento da ciência. Se as instituições privassem seus avanços dentro de suas instalações, diversas descobertas não seriam possíveis em estudos de outras instituições.

 

O professor também apresentou diversas fontes de financiamento na Austrália, dando destaque para duas que permitem parcerias entre o país e o Brasil. Uma delas é uma colaboração entre o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (CONFAP) e o The Department of Education (DoE) da Austrália, com um financiamento de $25.000,00. O objetivo é apoiar projetos entre pesquisadores australianos e brasileiros. 

 

Já o outro financiamento, oferecido pela Embaixada Australiana no Brasil, é para ex-alunos, no valor de $8.000,00. Este tem o objetivo de apoiar viagens e eventos científicos, mas que, infelizmente, desde fevereiro não está aberto para novas aplicações. 

 

Após as falas sobre inovação e financiamento na Austrália, foi a vez de conhecer mais um pouco sobre o Brasil. O diretor de Pesquisas de Novos Negócios do Grupo Jacto, doutor Tsen Chung Kang, realizou a apresentação “Ecossistemas de inovação e o Estado do Paraná”, contando sobre as possibilidades e caminhos para inovação existentes nas cidades paranaenses. O Grupo Jacto é composto por seis empresas que atuam nos segmentos agrícola, de fundição, tecnologias de aplicação de polímeros, transporte e logística, bem como de equipamentos para limpeza e médico-hospitalar. 

Apresentação do diretor Tsen Chung Kang

De acordo com o diretor, há cinco principais ecossistemas de inovação eminentes no mundo, que são responsáveis por reger as economias e avanços científicos: hardware e software (incluindo Inteligência artificial), ciências da vida e biotecnologia, robótica, power-to-x (novos combustíveis que são gerados a partir de fontes de energias renováveis) e materiais avançados e nanotecnologia.

 

O Brasil investiu suas energias em ciências da vida e biotecnologia, o que envolve grandemente a área da genômica. Nesse aspecto, o diretor destacou os trabalhos realizados pelo Vale do Genoma, localizado em Guarapuava. Desde 2021, esse ecossistema de inovação voltado à pesquisa genética e inteligência artificial aplicadas à saúde, promove pesquisas e estudos nesse campo. Além disso, tem como objetivo estabelecer um polo de startups na área genômica, englobando meio ambiente e agropecuária.

 

Como já destacamos, um ecossistema é formado por diversas instituições que colaboram entre si. O Vale do Genoma envolve governo, universidades, empresas, sociedade civil e, claro, pesquisadores, inclusive de outros estados. “O jogo principal para fazer um ecossistema de inovação funcionar é termos corporações, startups, apoiadores, negócios, governo, universidades, investidores, mentores e reguladores unidos no mesmo propósito. Este é o típico sistema de inovação e design”, afirma o diretor. 

 

Além do Vale do Genoma, como grande orquestrador desse ecossistema de inovação paranaense, os Novos Arranjos de Pesquisa e Inovação (NAPIS), da Fundação Araucária, são importantes sub-orquestradores, de acordo com Kang. Nesse caso, o NAPI Genômica cumpre esse papel. 

 

Para complementar a apresentação do diretor, na parte da tarde, os participantes da Missão tiveram a oportunidade de visitar o Instituto para Pesquisa do Câncer de Guarapuava (IPEC), que é a plataforma científica e tecnológica do Vale do Genoma.

Visita ao Instituto para Pesquisa do Câncer de Guarapuava (IPEC)

O grupo foi recebido pelo diretor executivo do IPEC, doutor Luis Gustavo Morello, que apresentou o Instituto, as instalações e os trabalhos. De acordo com ele, no IPEC é realizada a aplicação de metodologias em análise genômica de grande escala, abrangendo diferentes áreas da saúde, como câncer, neurogenética, doenças raras, nutrigenômica e também cardiogenética. Mas, também há trabalhos nos campos da agricultura, pecuária e ciências ambientais. 

 

O dia foi repleto de muita reflexão acerca da importância de financiamentos para o avanço da ciência, não apenas no Brasil, como também em diversos outros países. E, claro que as trocas de conhecimento não pararam por aí. Continue ligado nas próximas matérias sobre os dias de Missão! 

Apresentação das instalações do Instituto para Pesquisa do Câncer de Guarapuava (IPEC)

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